domingo, 7 de novembro de 2010

CONTROLO PREVENTIVO DO ÁLCOOL NA CÂMARA MUNICIPAL DE OLIVEIRA DO BAIRRO

Os funcionários da Câmara Municipal de Oliveira do Bairro - um ano depois do executivo ter aprovado a medida do controlo preventivo do álcool -, ainda não começaram a soprar no balão.

O presidente da autarquia diz aguardar a resposta de algumas entidades para que a medida possa ser posta em prática. Mas, num caso semelhante, na autarquia do Porto, a Comissão de Protecção de Dados considerou que os testes violam a vida privada dos trabalhadores.

Recorde-se que o regulamento interno foi aprovado, em Novembro de 2009, durante uma reunião de Câmara, com as abstenções dos deputados Henrique Tomás (PS) e Lília Ana (CDS/PP) e o voto contra do deputado Jorge Mendonça (ver no final o teor da declaração de voto apresentada).

Na última reunião de Câmara, Jorge Mendonça quis saber se já foram efectuados alguns testes e se existem resultados que possam dar origem a processos disciplinares. Mas Mário João Oliveira, presidente da Câmara, explicou que continua a aguardar resposta de algumas entidades.

De acordo com o regulamento interno, o consumo excessivo do álcool pode produzir efeitos negativos ao nível do absentismo, produtividade no trabalho, na relação com os utentes dos serviços e com os colegas de trabalho. Desta forma, a Câmara pretende contribuir para a prevenção e tratamento desta dependência, considerando que, "como entidade empregadora, tem um papel importante na promoção e criação dos mecanismos necessários à adopção de estilos de vida mais saudáveis".

Quem for apanhado com uma taxa de 0,5 gramas de álcool por litro de sangue (0,5 g/l) fica sujeito à pena de suspensão de funções. Quem recusar o teste viola o dever de obediência e fica sujeito ao regulamento disciplinar.

Mário João Oliveira já tinha dito que se trata de uma medida adoptada em outras autarquias e que pretende sensibilizar e disciplinar os funcionários.

Afirma ainda que os vereadores ficam de fora, já que o regulamento pressupõe, em caso de incumprimento, medidas disciplinares que não poderão ser aplicadas aos vereadores. Na mesma altura, Jorge Mendonça alertou que "a proposta consubstancia uma visão punitiva e não preventiva do consumo de álcool, ignorando que a abordagem a esta questão tem de ser encarada com um problema de saúde pública, devendo ser feita de modo preventivo".

Há um ano atrás, o Tribunal Central Administrativo do Norte proibiu a Câmara do Porto de efectuar testes de alcoolemia aos funcionários com base num parecer da Comissão Nacional de Protecção de Dados.

Publicado no JORNAL DA BAIRRADA, de 4 de Novembro de 2010

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Transcreve-se a seguir a declaração de voto apresentada pelo vereador Jorge Mendonça, ao abrigo do disposto no n.º 3 do art.º 93.º da Lei n.º 169/99, de 18 de Setembro, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 5-A/2002, de 11 de Janeiro.

“... Congratulo-me com a iniciativa de elaboração de um Regulamento Interno sobre o Controlo Preventivo de Consumo Excessivo do Álcool, a qual é francamente positiva. Apesar disso, e não obstante concordar inteiramente com a iniciativa, votei contra a proposta apresentada, não tanto pelo facto de o texto conter algumas gralhas ou incorrecções, as quais foram por mim referidas na minha intervenção, mas fundamentalmente pelo facto de a proposta ter algumas deficiências de substância, a saber:

1.º Apesar de no nº 1 do art. 4º da proposta ser dito que a eficácia dos procedimentos previstos no regulamento pressupõe a articulação de esforços e acções do Executivo Municipal, das estruturas dirigentes do Município e dos Órgãos de Representação dos Funcionários Autárquicos, o que é certo é que do respectivo preâmbulo não consta que estes órgãos tenham sido consultados para a elaboração deste regulamento, apesar da obrigatoriedade da audiência destes Órgãos de Representação - art. 117º nºs 1 e 2 do Código de Procedimento Administrativo;

2.º Para além disto, o art. 19º da proposta prevê que as dúvidas de interpretação e omissões serão resolvidas por deliberação da Câmara Municipal, quando a articulação de esforços antes mencionada sugere que tais dúvidas e omissões devessem ser resolvidas conjuntamente pelas estruturas dirigentes do Município e pelos Órgãos de Representação dos Funcionários Autárquicos;

3.º O art. 14º, nº 1 da proposta refere que a consequência da comparência ou permanência no serviço em estado de embriaguez pode ser o impedimento, meramente facultativo (pode ser) de iniciar ou retomar o exercício de funções prevista; ora, tal consequência tem de ser a efectiva suspensão do infractor, tal como está prevista no art. 17º, al. a) do Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores Que Exercem Funções Públicas aprovado pela Lei nº 58/2008, de 9 de Setembro;

4.º Apesar de o nº 1 do art. 4º da proposta referir que a eficácia dos procedimentos previstos no regulamento pressupõe a articulação de esforços e acções do Executivo Municipal e das estruturas dirigentes do Município, o regulamento é omisso quanto à estatuição sobre o controlo preventivo de consumo excessivo de álcool relativa ao pessoal dirigente; de facto, pese embora a insusceptibilidade de aplicação ao pessoal dirigente do Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores Que Exercem Funções Públicas aprovado pela Lei nº 58/2008, de 9 de Setembro, não pode ignorar-se os deveres que aos eleitos locais estão impostos pela Lei nº 29/87, de 30 de Junho (Estatuto dos Eleitos Locais) – só assim se compreende a inclusão do conceito de «pessoal dirigente» no art. 3º, al. c) da proposta;

5.º O art. 20º da proposta refere que a entrada em vigor ocorre no 1º dia útil após a sua publicação. Importa desde já referir que seria muito mais eficaz se, conjuntamente com a sua publicação fosse consignada a distribuição de um exemplar a cada trabalhador;

6.º Para além disso, a proposta em análise consubstancia uma visão punitiva e não preventiva do consumo de álcool, ignorando que a abordagem a esta questão tem de ser encarada com um problema de saúde pública, devendo ser feita de modo preventivo; por isso mesmo, seria importante que a eficácia do regulamento fosse precedida de um período experimental de pelo menos três meses, tempo durante o qual seriam realizados os testes sem que haver lugar à consequente instauração de processos disciplinares - só assim o regulamento cumpriria a função preventiva que se exige, demonstrando uma visão integrada na problemática do álcool na sociedade e, em particular, no ambiente de trabalho;

7.º Os resultados dos testes de alcoolemia constituem dados pessoais sensíveis na acepção dos arts. 3º, al. a) e 7º da Lei da Protecção de Dados Pessoais (Lei nº 67/98 de 26 de Outubro); assim sendo, a apreciação e deliberação do regulamento em análise tem de ser precedida de análise e parecer prévio da Comissão Nacional de Protecção de Dados (CNPD), para que esta entidade possa apreender, na sua integralidade, o tratamento de dados pessoais em causa;

8.º À falta de consentimento expresso dos avaliados (já que os testes, sendo obrigatórios, lhes são impostos) a recolha e processamento generalizados de informações relativas ao consumo de álcool ou estupefacientes, de entidades públicas ou privadas, têm de ser autorizados, por permitir a configuração de perfis de consumo personalizados, aspectos integrados na vida privada das pessoas carece de autorização da CNPD;

9.º Para tratamento dos dados pessoais dos avaliados, a Câmara Municipal, deve notificar a CNPD para obtenção da necessária autorização - art. 28º, nº 1, als. a) e b) da Lei da Protecção de Dados Pessoais (Lei nº 67/98 de 26 de Outubro);

10.º É que, se a omissão negligente deste pedido de autorização constitui contra-ordenação, já a omissão intencional constitui crime - arts. 37º e 43º da Lei da Protecção de Dados Pessoais (Lei nº 67/98 de 26 de Outubro);

11.º Esta omissão determina a nulidade do acto, uma vez que são nulos os actos a que falte algum dos seus elementos essenciais – art. 95, nº 1 da Lei nº 169/99 de 18 de Setembro com as alterações da Lei nº 5-A/2002 de 11 de Janeiro e art. 133º, nºs 1 e 2 als. c) e d) do Código de Procedimento Administrativo;

12.º Importa referir que os titulares dos órgãos e os agentes das autarquias locais respondem civilmente perante terceiros pela prática de actos ilícitos que ofendam direitos destes ou disposições legais destinadas a proteger os interesses deles, se tiverem excedido os limites das suas funções ou se, no desempenho destas ou por causa delas, tiverem procedido dolosamente - art. 96, nº 1 da Lei nº 169/99 de 18 de Setembro com as alterações da Lei nº 5-A/2002 de 11 de Janeiro;

Consigno a minha pretensão de inclusão na acta, do registo do presente voto de vencido e das razões que o justificam; este registo isenta o emissor da responsabilidade que eventualmente resulte da deliberação tomada - art. 93º, nºs 1 e 3 da Lei nº 169/99 de 18 de Setembro com as alterações da Lei nº 5-A/2002 de 11 de Janeiro ...”