sexta-feira, 6 de agosto de 2010

AFINAL, OS PROCURADORES PEDIRAM PARA OUVIR SÓCRATES MAS A AUTORIZAÇÃO NÃO CHEGOU

Procurador-geral tem repetido que os investigadores "ouviram quem quiseram, como quiseram e onde quiseram". Os autos mostram que não foi exactamente isso que se passou.

Vítor Magalhães e Paes de Faria, os procuradores responsáveis pela investigação do caso Freeport desde Outubro de 2008, pediram formalmente, no dia 12 de Julho, para ouvir o primeiro-ministro e o ministro da Presidência por escrito. O pedido foi dirigido à sua superior imediata, a directora do Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP), Cândida Almeida, e foi acompanhado dos questionários dirigidos a Sócrates e Pedro Silva Pereira, bem como dos respectivos anexos documentais. A resposta não consta dos autos, mas, como se sabe, os procuradores escreveram no despacho final que a fixação do prazo de 25 de Julho, para concluir o inquérito, inviabilizou a realização daquelas e doutras diligências.

O procurador-geral da República, Pinto Monteiro, disse nos últimos dias, em comunicado e numa entrevista ao Diário de Notícias, que os investigadores ouviram quem quiseram, sem quaisquer restrições. Os autos do processo - que deixaram de estar em segredo de justiça no dia 27 - evidenciam, contudo, que os procuradores, três semanas depois de terem recebido, a 21 de Junho, o relatório final da Polícia Judiciária (PJ), com 535 páginas, e quando ainda aguardavam resposta a quatro cartas rogatórias dirigidas a autoridades estrangeiras, pediram para ouvir Sócrates e Silva Pereira. E que não lhes foram criadas condições para que isso acontecesse.

Prazo "definitivo".
A única forma de o conseguir, até porque no caso de Sócrates a sua inquirição implicava uma autorização do Conselho de Estado, passava pelo alargamento do prazo estabelecido em 4 de Junho pelo vice-procurador-geral, Mário Gomes Dias, para acabarem o inquérito. Para reforçar a ideia de que os dois magistrados podiam ter ouvido aqueles membros do Governo, mesmo que entendessem fazê-lo só no final da investigação, Pinto Monteiro escreveu, no seu comunicado de sexta-feira, que a data de 25 de Julho para o fecho do inquérito foi determinada "com a possibilidade de prorrogação do prazo, como acontece quando a especial complexidade do processo o justifique".

No entanto, o que Cândida Almeida pediu ao procurador-geral no passado dia 28 de Maio, e que teve o acordo do seu substituto, foi que fosse concedido, "a título muito excepcional e definitivo, o prazo de 55 dias, ou seja, até 25 de Julho, para a conclusão da fase de inquérito". E no seu despacho, Gomes Dias, embora salvaguardando que "após a elaboração do relatório final da PJ importa apreciar a necessidade de realização de eventuais diligências complementares", aceitou a data proposta, concluindo que deverá ser "dada prioridade à tramitação do inquérito, de forma a, pelo menos no prazo indicado pela senhora directora do DCIAP, se proceder ao seu encerramento".

Cândida Almeida, num outro despacho que proferiu no dia 7 de Junho, reforçou também a ideia de que o dia 25 de Julho era uma data indiscutível, escrevendo que os procuradores "terão até dia 25 de Julho, no máximo, o prazo para análise daquele relatório final [da PJ], eventual determinação de diligências complementares e decisão final nesta fase de inquérito".

O porquê das perguntas.
No ofício em que Vítor Magalhaes e Paes de Faria pediram a Cândida Almeida para que tomasse as "necessárias providências no sentido de se proceder à inquirição" de Sócrates e Silva Pereira por escrito, explica-se o pedido com o facto de aqueles terem sido, respectivamente, ministro do Ambiente e secretário de Estado do Ordenamento do Território e Conservação da Natureza à data da viabilização do Freeport. Mas não só por isso. Também "por terem sido referidos em diversos momentos do inquérito, por alguns intervenientes, bem como em documentos apreendidos, designadamente José Sócrates, importa que se proceda à inquirição de ambos, não obstante a ausência de qualquer proposta da PJ nesse sentido".

O documento que está nos autos não está assinado, é uma cópia, nem lá estão os questionários e os anexos referidos no texto. Ausente está também o despacho, se é que houve algum, da directora do DCIAP relativamente ao pedido. A inviabilização destas inquirições, por ausência de despacho favorável da directora e por esgotamento do prazo "definitivo" fixado aos investigadores, terá sido a razão da controversa inclusão, no despacho final, pelos dois titulares do inquérito, das 27 perguntas que queriam fazer a José Sócrates e das dez destinadas a Pedro Silva Pereira.

José António Cerejo, aqui