domingo, 12 de junho de 2011

JOGO SUJO

A noite eleitoral decorreu com normalidade e com elevação, tal como sucedeu, de resto, com a campanha eleitoral que, tendo sido muito dura, não foi palco de acusações pessoais, nem deu lugar a "jogos sujos", como muitos temiam.

O discurso de José Sócrates foi digno, e o primeiro-ministro derrotado não merecia a pergunta que lhe foi colocada no final.

Como essa pergunta também não merecia a vaia da carneirada, que só desmereceu o seu líder, numa forma de apoio perfeitamente dispensável e desnecessária em fim de mandato.

Pedro Passos Coelho, pelo seu lado, fez um discurso de Estado, virado para o futuro e sem laivos de revanchismo. Poder-se-á dizer, pois, que ao contrário do que sucedeu nas presidenciais, os partidos políticos e os seus líderes estiveram à altura das circunstâncias difíceis em que as eleições decorreram.

Mas, no rescaldo das eleições, enquanto o presidente da República procura acelerar o processo de nomeação do novo Governo, o PSD e o CDS negoceiam a formação do novo Governo e o PS discute a sua nova liderança, eis que surge Ana Gomes a disparar as suas habituais atoardas, desta vez dirigidas a Paulo Portas.

Aceitar-se-á que Ana Gomes se preocupe com os submarinos. O facto de este caso não estar, ainda, resolvido pelos tribunais, é um facto político relevante, e que lhe pode interessar para construir as suas teses. Aliás, a eurodeputada nunca hesitou em levantar suspeitas sobre casos que envolviam, também, o Governo do seu partido, como sucedeu com os voos da CIA. A sua carreira política tem sido construída assim, à custa de levantar suspeitas, muitas vezes levianas, e que, em geral, ultrapassam a mera divergência política.

No entanto, a eurodeputada foi longe de mais quando acusou Paulo Portas de ter organizado uma central de desinformação para desacreditar responsáveis do PS no caso Casa Pia, e quando invocou os velhos rumores publicados por um jornal francês sobre ministros do Governo de Barroso que recorreriam à prostituição para comparar Portas a Strauss-Kahn.

Ora, é no mínimo extraordinário que Ana Gomes insista nas teses da conspiração no caso Casa Pia, esquecendo as suas vítimas e desvalorizando o trabalho dos agentes judiciários. É inaceitável, e a todos os títulos irresponsável, a invocação de Strauss-Kahn que, recorde-se, está acusado de tentativa de violação, ou seja, de um crime, para proceder a uma qualquer comparação com Portas. Desde logo, porque não se conhece qualquer situação análoga que envolva o líder do CDS, e por outro lado, porque não é crível que Ana Gomes possa ter algum conhecimento privilegiado de que não tenha dado conta às autoridades.

Mas, admitindo que este é o seu estilo de intervenção, o que melhor se adequa ao seu carácter e o que lhe é permitido pela teia de impunidades que se conhece, a verdade é que há, nessas suas declarações, uma contradição. Porque, como se sabe, Ana Gomes notabilizou-se na defesa de Paulo Pedroso, invocando então que o seu velho amigo e correligionário tinha o direito à presunção de inocência e, mais do que isso, que a sua carreira política não podia ser afectada pelo caso Casa Pia, tendo mesmo chegado a admitir que poderia, ainda, chegar a primeiro-ministro.

Ou seja, não hesita em levantar suspeitas gratuitas sobre Portas, invocando meros rumores, e considera que, por isso, ele não deve fazer parte do Governo, mas já entende ser razoável que quem foi, de facto, acusado de estar envolvido num caso tenebroso, não deva estar sujeito a esse crivo.

A eurodeputada é uma daquelas pessoas que infelizmente abundam na nossa sociedade, mas que devem ser denunciadas e expulsas da política, que clamam pela moral e pelos bons costumes, que vigiam os adversários e não hesitam em recorrer à calúnia para os condenar à fogueira, mas que, em contrapartida, estão sempre disponíveis para, em nome de uma solidariedade cega, defender os membros da sua clique que, só por essa razão, devem estar acima da lei e livres de todos os constrangimentos que só devem ser impostos aos outros.

Rui Moreira, aqui